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O Cultor da Investigação Criminal Escrita em Moҫambique

 

O académico, Victor Manuel de Aguiar e Silva (1988), preconiza três modos literários que os considera astóricos, a saber: Lírico, Narrativo e Dramático. Importa destacar o género, mais proeminente da Narrativa: o Romance. Assim, por este  ser um género da Narrativa, é histórica. Pelo que, não se pode exigir romances clássicos (calhamaҫos de papel) à uma literatura de expressão e ou de tradição oral. Neste sentido, Rabhia (2019), de Lucílio Manjate, publicado pela Alcance editores, constituído por um pouco mais de 139 p., não foge deste escrutínio. No entanto, foi através do romance policial que ganhou o prémio Eduardo Costely-White 2016. Manjate, é professor de literatura e coordenador editorial da Fundação Fernando Leite Couto. Para além disso, é autor de obras como “Os Silêncios do Narrador” (2010), prémio 10 de Novembro, do Município de Maputo 2008; “A Legítima Dor Da Dona Sebastião” (2013) e “A Triste História De Barcolino: O homem que não sabia morrer” (2017). Neste sentido, Gilberto Matusse, igualmente, professor de Literatura, considera-o como “um dos autores que mais contribuem para cativar um lugar de dignidade para este policial assumido na Literatura Moçambicana”.

Manjate, constrói uma Rabhia, jovem cega que sai fugida da guerra, na sua terra natal junto do namorado. Mas se perde do mesmo aquando da chegada à cidade de Maputo, antiga Lourenço Marques. Nesta óptica, depois de percorrer uma certa distância, Rabhia pára numa zona de prostituição na qual instala-se e ganha, com a anuência da tia, dona Amargarida, o título de melhor prostituta da região. Passado algum tempo, é, misteriosamente, assassinada. Desta forma, o detective Sthoe passa a ser responsável pela investigação e Bernardo Sozinho, jovem estagiário, com quem Sthoe trabalha, ajuda o mestre na desmistificação do crime. E, é onde descobre-se tudo que esteve por detrás daquele infortúnio: o acontecido à Rabhia não passara, infelizmente, de um esquema que envolve o detective Sthoe, a dona Amargarida, senhora cujo título de melhor prostituta Rabhia assumiu e esta torna-se a cifra do homicídio.

Nesta história “Rabhia” é trazido ao público a sabor e a estilo moçambicano, o que retrata as vivências diárias que nos chamam a uma análise profunda da realidade concreta. Para tanto, muito à propósito da celebração do dia mundial da língua portuguesa, 05 de Maio com o lema “Línguas Indígenas”, este romance vem à tona e revela o impacto e a influência que estas línguas tem sobre a língua oficial portuguesa, assim, como afirma Firmino (2006), para além da oficilalizaҫão da língua portuguesa no moçambique independente, houve, também, a apropriação. Esta que se caracterizou pelo surgimento de traҫos gramaticais próprios, isto é, os moçambicanos manusearam a língua a seu estilo. Tomemos o seguinte exemplo: “contudo somos maningue felizes” (p.139). Portanto, é possível não ouvir essa expressão meramente moçambicana em vários pontos do país. Já, Ferrão, escreveu para o jornal “O País”, no âmbito da celebração do dia mundial da língua portuguesa, 05 de Maio de 2022: “Nós, moçambicanos soubemos tomar o português numa língua melodiosa, poética e sensual.” o que se justifica neste  proeminente clássico do escritor.

Este romance, para além de ser um instrumento interessantíssimo e importante da valorização do português moçambicano, o autor soube denunciar, astuciosamente o sistema investigativo mundial e, sobretudo o sistema moçambicano, pois, os oficiais da área da investigação criminal, tem, inteiramente, colaborado para os esquemas de crime e ou raptos que são pré-articulados. Manjate, formulou e conjugou, à mistura de Couto – em “A Confissão da Leoa” (2012) e Ungulani, em “Os Sobreviventes da Noite” (2005) -, o espaҫo de um agente recém-saído da formação e foi-lhe enquadrado num sistema já delineado na narrativa, através de seus personagens, tal é o caso do Inspector Sthoe: “O estagiário voltou a olhar para o mestre. Sthoe leu-lhe a acusação. Sempre soube que teria de intervir, mas não imaginava a defender-se de uma acusação, pois desde o princípio desta história teve controlo”. (p. 107); para se livrar das ameaças do teu tio ele precisava de um caso urgente; armamos e encenamos toda esta farsa, até fingimos que não nos conhecemos. (P. 135).”

Terminamos, portanto, por dizer que esta obra devia ser de leitura obrigatória pelas autoridades “competentes” de modo a que possa causar profundas metamorfoses ao sistema investigativo, se bem que, isto recorda-nos uma frase de Mia, “triste é ter para quem chorar”. E, o escritor, teve para quem chorar, por isso, devia ser ouvido.

Referências Bibliográficas

Biblografia Activa:

MANJATE, Lucílio (2019) Rabhia. Maputo: Alcance editores.

Bibliografia Passiva:

SILVA, Victor Manuel de (1988) Teoria da Literatura. 8ª Ed. Coimbra: Almedina.

KHOSA, Ungulani Ba Ka (2021) Os Sobreviventes da Noite. Maputo: Cavalo do Mar.

COUTO, Mia (2012) A Confissão da Leoa. Maputo: Ndjira.

FERRÃO, Jorge (2022) Dia Munidial da Língua Portuguesa In O País. Acessado a 20 de Maio de 2022, pelas 10h:15min.

Por Gil Cossa

Crítica Linguística 02: ‘‘Rabhia’’ de Lucílio Manjate

 

Recensão crítica da obra “Viagens na Minha Terra” de Almeida Garrett

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Fernando Chaúque

FERNANDO ABSALÃO CHAÚQUE Licenciado em Ensino de Língua Inglesa pela Universidade Pedagógica de Maputo, é professor de profissão. É também escritor, autor do livro “Âncora no Ventre do Tempo” (2021), Prémio Literário Alcance Editores, edição de 2019, e co-autor das seguintes obras: “Barca Oblonga” (editora Fundza, 2022), “Mazamera Sefreu” (editora Kulera, 2023) e “Atravessar a pele” (Oitenta Noventa, 2023). Fez parte dos livros “Os olhos Deslumbrados” (FFLC, 2021); “Um natal experimental e outros contos” (Gala Gala edições, 2021).

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