O surgimento da literatura moçambicana seguiu quase os mesmos passos que a formação das outras literaturas africanas da língua portuguesa. O referido caminho é em relação à imprensa.
Segundo Laranjeira (1992), o mais importante a destacar na imprensa da época é, O Brado Africano (1918) dos irmãos José e João Albasini, de orientação para temas das populações locais, em que se reúnem os autores como Rui de Noronha, Fonseca Amaral ou Virgílio Lemos. João Albasini é também autor de uma obra fundacional na poesia moçambicana, O Livro da Dor (1925). Por outro lado, os primórdios da ficção devem-se a João Dias com Godido (1952).
O autor acima afirma também que, nos inícios do século XX escreve também Rui de Noronha (Sonetos, 1946, postumamente). Mais tarde surgem as revistas Itinerário (1941–1955) e, sobretudo, Msaho (1952), preocupada com a “moçambicanidade”, com número único, em cujas páginas foi publicado o que era essencial na poesia da época.
Neste período, antes da independência, há pelo menos três poetas que devem ser salientados: Noémia de Sousa (Sangue Negro), José Craveirinha, o “poeta nacional”, com obra nos jornais, revistas e gavetas (Xigubo, 1964, Karingana ua Karingana, 1974, Cela 1, 1980, e Maria, 1988) e Rui Knopfli (Mangas Verdes com Sal, 1969).
Ainda nesta senda, Laranjeira (1992) sublinha que, na prosa destaca-se Luís Bernardo Honwana (Nós Matámos o Cão Tinhoso, 1964) e Orlando Mendes, o autor do primeiro romance moçambicano (Portagem, 1966). Em 1971–1972 saem ainda os cadernos Caliban sob a direcção de António Quadros, Eugénio Lisboa e Rui Knopfli, de carácter cosmopolita, não vinculado à luta pela libertação, onde são publicados autores portugueses ao lado de moçambicanos.
Após a independência, aparece a revista Charrua (1984), em que se revelam os novos autores como Ungulani Ba Ka Khosa, e Gazeta de Artes e Letras (da revista Tempo), dirigida por Luís Carlos Patraquim, um dos maiores nomes da poesia contemporânea (Monção, 1980). Entre os autores contemporâneos, mundialmente conhecidos e traduzidos, destacam-se Mia Couto e Paulina Chiziane.
Ferreira (1976) afirma que, a literatura política e de combate em Moçambique surgiu no contexto da luta pela independência do país, que durou de 1964 a 1974. Esse movimento literário teve como principal objectivo mobilizar a população para a luta contra o colonialismo português e reivindicar a afirmação da identidade moçambicana.
O nacionalismo e a moçambicanidade foram temas centrais dessa literatura. Os escritores e poetas procuraram destacar a cultura e as tradições do povo moçambicano, evidenciando a sua diversidade e riqueza, ao mesmo tempo em que denunciavam a exploração e a opressão imposta pelo colonialismo português.
Um exemplo dessa preocupação com a afirmação da identidade moçambicana pode ser visto no poema “Identidade”, de José Craveirinha em que o autor ressalta a importância da cultura e da língua moçambicanas como elementos fundamentais da identidade do povo do país.
Para Laranjeira (1992), Outro importante escritor da literatura de combate em Moçambique foi Luís Bernardo Honwana, que em seu livro “Nós Matámos o Cão Tinhoso”, retracta a vida das populações rurais moçambicanas sob o domínio colonial. O livro evidencia a luta pela sobrevivência em um contexto de opressão e exploração, destacando a resistência e a força do povo moçambicano.
Noémia de Sousa, por sua vez, foi uma importante poetisa e jornalista que se destacou por seus poemas de cunho político e social. Em sua poesia, ela denuncia a exploração e a opressão imposta pelo colonialismo português, evidenciando a importância da luta pela liberdade e pela igualdade de direitos. Em seu poema “A África Chora”, Noémia de Sousa retracta a dor e o sofrimento do povo africano diante das injustiças e das violências cometidas pelo colonialismo.
A literatura de combate deixou um importante legado na história cultural e política do país, evidenciando a importância da luta pela liberdade e pela igualdade de direitos. Além dos autores acima, há que ressaltar que Kalungano, Armando Guebuza e outros poetas e escritores foram muito importantes neste período.
Em suma, A literatura de combate em Moçambique refere-se à produção literária que surgiu durante o período de luta armada pela independência do país, que durou de 1964 a 1974. Essa literatura teve como objectivo principal mobilizar a população moçambicana para a luta contra o colonialismo português, além de documentar e denunciar as atrocidades cometidas pelos colonizadores.
3. O papel de José Craveirinha, Noémia de Sousa e Rui de Noronha, na formação da Literatura Moçambicana
José Craveirinha, Noémia de Sousa e Rui de Noronha desempenharam importantes papeis na formação da literatura Moçambicana. Abaixo faz-se uma breve análise sobre o papel de cada um deles.
3.1 O papel de José Craveirinha
Segundo Lopes (2002), José Craveirinha é considerado um dos principais escritores moçambicanos e teve um papel fundamental na formação da literatura do país. Como poeta, contista e jornalista, Craveirinha destacou-se pela sua preocupação com as questões sociais e políticas de Moçambique, evidenciando a luta do povo moçambicano contra o colonialismo português.
Uma das principais contribuições de Craveirinha foi a sua colaboração no “O Brado africano” fundano pelos irmãos Albasine. O Brado Africano foi uma importante plataforma para a divulgação da literatura moçambicana e africana em geral. A revista foi lançada em 1948 e se tornou um espaço de resistência cultural e política, onde escritores e intelectuais moçambicanos puderam expressar suas ideias e denunciar as injustiças do colonialismo.
Além disso, Craveirinha é conhecido por ter introduzido a poesia moderna em Moçambique, influenciando gerações de poetas que vieram depois dele. Sua poesia, que muitas vezes aborda temas como a identidade moçambicana, a luta pela liberdade e a injustiça social, trouxe uma nova sensibilidade à literatura do país e ajudou a definir uma estética literária própria.
Outra importante contribuição de Craveirinha para a literatura moçambicana foi a sua preocupação com a língua portuguesa como ferramenta de expressão literária. Craveirinha acreditava que a literatura moçambicana deveria ser escrita em português, mas que os escritores deveriam buscar uma linguagem que fosse ao mesmo tempo acessível ao público e rica em elementos culturais moçambicanos.
Em sua obra, Craveirinha evidencia uma profunda conexão com a cultura e a história do povo moçambicano, e sua poesia é permeada de elementos simbólicos e referências a tradições orais. Seu trabalho abriu caminho para uma nova geração de escritores e poetas que vieram depois dele e que se inspiraram em sua visão de uma literatura moçambicana comprometida com a luta pela liberdade e a afirmação da identidade do país.
Em resumo, o papel de José Craveirinha na formação da literatura moçambicana foi fundamental, tanto por sua actuação como editor e divulgador da literatura do país, quanto por sua contribuição como poeta e defensor de uma linguagem literária acessível e rica em elementos culturais moçambicanos. Sua obra e visão literária influenciaram profundamente a literatura de Moçambique e continuam a inspirar novas gerações de escritores e poetas.
3.2 O papel de Noémia de Sousa
Noémia de Sousa foi uma importante figura na formação da literatura moçambicana, especialmente por seu trabalho como poeta, jornalista e activista. Como muitos escritores da época, Noémia de Sousa buscou abordar em sua obra questões sociais e políticas que afectavam o povo moçambicano durante o período colonial.
Para Leite (2005), uma das principais contribuições de Noémia de Sousa para a literatura moçambicana foi sua poesia, que foi considerada inovadora e revolucionária em seu tempo. Sua obra, “Sangue Negro” aborda temas como a luta pela libertação, a opressão colonial e a afirmação da identidade negra moçambicana.
Além disso, Noémia de Sousa foi uma das primeiras escritoras moçambicanas a utilizar a língua portuguesa de forma consciente e crítica, buscando subverter a linguagem dominante e torná-la mais acessível ao público moçambicano. Em sua poesia, ela frequentemente incorporou elementos da cultura moçambicana, como provérbios, cantigas e mitos, e fez uso da língua ronga, uma das línguas nativas de Moçambique.
Outra importante contribuição de Noémia de Sousa foi a sua actuação como jornalista e activista político. Ao longo de sua carreira, Noémia de Sousa desafiou as normas literárias e culturais da época, utilizando a poesia como uma forma de resistência e afirmação da identidade moçambicana. Sua obra e actuação política inspiraram gerações de escritores e activistas e ajudaram a definir uma estética literária própria para Moçambique (Leite, 2005).
Rui de Noronha, nascido em 1909 em Moçambique, foi uma das figuras mais importantes na formação da literatura moçambicana, particularmente na poesia. A sua obra é uma referência incontornável para a literatura moçambicana e lusófona e é considerada uma expressão singular da poesia africana em língua portuguesa.
Segundo Ferreira (1976), Rui de Noronha, como muitos escritores da sua geração, lutou contra o colonialismo português e procurou afirmar a sua identidade moçambicana através da literatura. A sua obra poética revela uma sensibilidade muito apurada para as tradições e a cultura moçambicana, ao mesmo tempo que denuncia a exploração colonial e a opressão racial.
Na poesia de Rui de Noronha, é frequente encontrar uma forte crítica social e uma denúncia da exploração do povo moçambicano pelo colonizador. A sua poesia também destaca o orgulho na cultura africana e a luta pela libertação dos povos africanos. Como afirmou o próprio Rui de Noronha, a sua poesia tinha como objectivo “criar um sentimento de moçambicanidade, que não significasse o antagonismo racial ou o isolamento, mas a compreensão e o amor pela terra e pelo povo moçambicano”, Laranjeira (1992).
Em resumo, o papel de Rui de Noronha na formação da literatura moçambicana foi fundamental, sobretudo pela sua poesia inovadora e crítica, que se tornou uma referência para a literatura africana de língua portuguesa.
Em suma, a literatura moçambicana é um importante património cultural, que reflecte a história e as lutas do povo de Moçambique. A literatura política e de combate desempenhou um papel fundamental na luta pela independência e na construção da identidade nacional, ao expressar as aspirações e os desafios enfrentados pelo país. Ao longo deste trabalho, foi possível compreender como José Craveirinha, Noémia de Sousa e Rui de Noronha são algumas das figuras mais proeminentes na formação da literatura moçambicana e como suas obras literárias e seus engajamentos políticos e sociais foram fundamentais para a construção da identidade nacional e da moçambicanidade.
Por meio da análise desses autores, pudemos perceber como a literatura pode ser um instrumento poderoso de expressão e transformação social. Além disso, esses autores também mostram a importância da resistência e da luta pela liberdade e pelos direitos humanos, em um contexto de opressão e exploração. A literatura de combate moçambicana, portanto, é um exemplo de como a arte pode ser uma forma de luta e de resistência contra as injustiças sociais e políticas.
Por fim, é importante ressaltar que a literatura moçambicana ainda continua a se desenvolver e a se transformar, assim como a própria história e as lutas do povo moçambicano. Portanto, é fundamental valorizar e estudar a literatura moçambicana e suas raízes históricas, a fim de compreendermos melhor a diversidade cultural e a complexidade política do país e da África como um todo.
FERREIRA, M. (1998). No Reino de Caliban. Lisboa, Seara Nova
FERREIRA, M. (1976). No Reino de Caliban III, Antologia Panorâmica da Poesia africana de Expressão Portuguesa, Lisboa, Plátano Editora.
LARANJEIRA, J. (1992). Literaturas Africanas de Expressão Portuguesa, Lisboa.
LEITE, A. M. (2005). Noémia de Sousa: Uma Voz da África. Maputo: Alcance Editores.
LOPES, T. (2002). José Craveirinha: O Poeta do Povo. Lisboa: Caminho.