Quinta-feira, Novembro 21

Fácil é explicar a origem da vida nos seres humanos, embora, teorias diversas defendam que a vida provém de fontes variadas. Existem teorias como a da evolução das espécies, que advogam que o Homem é obra da evolução ao longo do tempo, da ínfima partícula para uma substância consistente. E teorias como a determinista, defendem que o Homem é resultado do meio que o rodeia, ou seja, a evolução do Homem é explicada pelo meio em que está inserido.

Várias são as explicações que buscam clarificar a génese da vida no Homem; e a morte, quem busca explica-lá? Continua um mistério que assusta até os mais doutos deste planeta; continua um assunto que mexe com a sensibilidade de todos, até dos que têm “pedra” no lugar do coração. A morte é um assunto comentado por todos, mas ninguém a explica com exactidão.

Numa tentativa de explicar a morte nas terras desconhecidas da ilha São Nicolau, Izidine Naíta inspector da polícia, é incumbido a tarefa de desvendar o mistério por detrás do desaparecimento físico de Vasto Excelêncio. Esse é o enredo que Mia Couto traz n‘A Varanda do Frangipani. A história é narrada por um morto apelidado Ermelindo Mucanga, que brinca de ser alma no corpo do inspector Izidine Naíta, ao mesmo tempo que é testemunha das incursões do inspector na busca pelo esclarecimento da misteriosa morte do garboso Excelêncio. 

A trama desfia-se entre as lúcidas loucuras dos velhos do asilo São Nicolau, e as intermitências insanas da enfermeira Marta Gimo. E desses devaneios dos personagens que erguem o livro, saberes gravitam nas entrelinhas para moldarem nossas pegadas nesta jornada chamada vida. Abaixo estão alguns pensamentos deixados pelas “figuras dramáticas” do livro.

  1. A pessoa deve sair do mundo tal igual como nasceu, enrolada em poupança de tamanho;
  2. Coisa que brilha é chamatriz da maldição;
  3. Um herói é como o santo. Ninguém lhe ama de verdade. Se lembram dele em urgências pessoais e aflições nacionais;
  4. O veneno, em doses, nos dá mais vivência;
  5. Um vivo pisa o chão, um morto é pisado pelo chão;
  6. Limpavam-se os campos dos maus-olhados;
  7. A boca fala mas não aponta;
  8. Se não há proprietário não há roubo;
  9. O silêncio é que fabrica as janelas por onde o mundo se transparenta;
  10. Quem é gota sempre pinga, quem é cacimbo se evapora;
  11. Entre os mil bichos, só o homem é um escutador de silêncios;
  12. A vida da pessoa se estende por anos, demorada como um desembrulho que nunca mais encontra as destinadas mãos;
  13. A gente se arrepia por vermos confirmados os buracos por onde nos vamos escoando;
  14. O que se encontra nesta vida não resulta de procurarmos;
  15. O mar… carrega mais traição que ondas;
  16. Quem confunde céu e água acaba por não distinguir vida e morte;
  17. A velhice… é… a morte estagiando em nosso corpo;
  18. Quando se é velho toda a hora é de conversa;
  19. Os anjos não têm pés;
  20. Ser branco não é assunto que venha da raça;
  21. O tempo é um fumo, nos vai secando as carnes;
  22. Branco é como camaleão, nunca desenrola todo o rabo;
  23. Nascemos com o umbigo na barriga, morremos no oposto;
  24. Somos todos parentes saídos da mesma matéria;
  25. Ninguém obedece senão em fingimento;
  26. Uma velha sempre arrisca a ser olhada como feiticeira;
  27. As coisas começam mesmo antes de nascerem;
  28. A morte é como uma nudez: depois de se ver quer-se tocar;
  29. Cada qual tem tristezas que são maiores que a humanidade;
  30. Os mortos se agarram à alma e nos arrastam com eles para as profundezas;
  31. Os mortos servem para apodrecer a pele deste mundo;
  32. De onde saiu sangue não pode escorrer leite;
  33. A vida é uma casa com duas portas;
  34. Todos temos nossos desconhecimentos;
  35. Quem quer apanhar o gafanhoto tem que se sujar na terra;
  36. A velhice não… dá nenhuma sabedoria, simplesmente autoriza outras loucuras;
  37. A vida é a maior bandoleira: sabemos que existimos apenas por sustos e emboscadas;
  38. As mulheres que vêem seus filhos morrer ficam cegas;
  39. Os sonhos são como as nuvens: nada nos pertence senão a sua sombra;
  40. Nós nada descobrimos. As coisas se revelam;
  41. A cobra pode reinstalar-se na pele que largou?
  42. Um viajante nunca deve partir no crepúsculo.

A Varanda do Frangipani faz-se de saberes que tornam a vida mais leve que a pena de uma ave gravitando pelos ares; e para melhor interpretação e compreensão das frases acima expostas, é lendo o livro; por isso, é convidado, caro leitor, a mergulhar nas entrelinhas do Frangipani, afogar-se no discurso dos velhos, nas intermitências da Gimo, no ensejo do Ermelindo, nas penumbras do Izidine e garimpar os saberes expostos no aroma floral da frangipaneira. Desejo-lhe uma agradável leitura e releitura (para quem já leu o livro)!

“A vida é o intervalo entre o tempo e a morte” – Flash Enccy.

Por Arnaldo Tembe

Todas as novidades no seu email!

Verifique na sua caixa de correio ou na pasta de spam para confirmar a sua subscrição.

Share.

FERNANDO ABSALÃO CHAÚQUE Licenciado em Ensino de Língua Inglesa pela Universidade Pedagógica de Maputo, é professor de profissão. É também escritor, autor do livro “Âncora no Ventre do Tempo” (2021), Prémio Literário Alcance Editores, edição de 2019, e co-autor das seguintes obras: “Barca Oblonga” (editora Fundza, 2022), “Mazamera Sefreu” (editora Kulera, 2023) e “Atravessar a pele” (Oitenta Noventa, 2023). Fez parte dos livros “Os olhos Deslumbrados” (FFLC, 2021); “Um natal experimental e outros contos” (Gala Gala edições, 2021).

Leave A Reply

Exit mobile version