Ungulani Ba Ka Khosa, o nome tsonga de Francisco Esaú Cossa, nasceu em 1957 em Inhaminga, Sofala. Tem o título de Bacharel em História e Geografia. É um escritor moçambicano que começou a publicar depois da era colonial. Conta com mais de cinco obras publicadas e com varias distinções nacionais e internacionais.
O seu livro de estreia Ualalapi venceu o prémio de ficção Moçambicana. É a partir desta obra que a história factual moçambicana vira matéria e temática para a escrita deste escritor. Em Ualalapi, Ungulani recupera traços da história factual referente a eventos que decorreram em Moçambique. De facto, nesta obra, o autor revisita o final do século XIX, no qual desponta o retrato cruel de um Império em decadência e degradação, cuja figura principal é Ngungunhane. Portanto, Leite (1995:37) afirma que esta obra tematiza o passado recente de Moçambique numa perspectiva que faz com que este texto também seja reformulado e questionado à luz do presente.
O texto reencena, ainda, os confrontos com changanes, chopes e com o exército português, até sua deposição e exílio de Ngungunhane em Portugal. Na descrição dos acontecimentos, Ba Ka Khosa retoma todo um mundo de tradições e mitos, sendo os negros, nessa altura, os heróis nas guerras de ocupação e na resistência ao invasor durante o processo de colonização do espaço moçambicano (Dutra, 2009).
Na verdade, o eixo temático desta obra gira em torno de uma espécie de relato étnico-histórico. Ou seja, nas laudas deste livro, a história factual é matéria principal a qual o autor a recheia pelos seus dotes ficcionais de modo a trazer à tona uma análise literária em torno do império de Gaza e da colonização.
Ademais, Leite (1995:37) defende que nesta obra Khosa focaliza factos históricos de Moçambique a partir de sua composição diversa, a que se acrescentam os séculos marcados pela dominação portuguesa contra a qual Ngungunhanhe se voltou. Ao nível enunciativo, tal construção é alcançada pela multiplicidade de relatos que delineiam progressivamente os passos da personagem.
Ungulani não aborda esta temática apenas neste livro. Fá-lo também no livro Orgia de loucos, obra publicada em 1990. Segundo Dutra (2009) nesta obra o autor lança mão de uma linguagem rebuscada e de um tom hiperbólico, para dar conta dos desdobramentos político-sociais ocorridos no Moçambique pós-colonial. Nesta ordem de ideia, a história e as origens míticas de Moçambique se tornaram veículos de afirmação cultural e de reivindicação político-ideológica de que Ba Ka Khosa não prescinde em seus textos e aos quais retorna sistematicamente.
No livro Entre as Memórias Silenciadas, Ungulani volta a invocar a história factual. Na verdade, este livro tem narrativas que decorrem na cidade, no meio rural e em campos de reeducação localizados na região do Niassa, do Cabo Delgado e de Sofala.
Na verdade, o autor faz uma análise crítica em torno do que o partido único decidiu fazer sem fundamentos humanísticos com membros de grupos religiosos, os considerados improdutivos, prostitutas, bem como jovens com curso superior, com o alegado objectivo de desenvolver regiões onde havia pouca população.
Em poucas palavras, os livros de Ba Ka Khosa assentam-se na história factual vista como mediadores entre o ontem e o hoje e, sobretudo, reunindo maneiras distintas de compreensão do actual contexto histórico moçambicano.
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A temática da construção da nacionalidade Angolana em Pepetela
Pepetela é um dos escritores e romancistas angolanos mais conhecido de Angola. Lançou o seu primeiro livro, As Aventuras de Ngunga em 1972 e até então nunca parou de escrever. O seu último livro intitulado Sua Excelência, De Corpo Presente foi lançado em 2018.
Fazendo uma intrínseca radiografia temática do conjunto da sua obra é notável a construção da nacionalidade como um tema constante que, sob vários ângulos e perspectivas, permeia e transversa a sua produção literária. Ou seja, o tema da formação da nação angolana é o denominador comum em seus romances.
Esta temática está presente logo no primeiro livro deste autor, que ‘’a princípio era para ser apenas um conjunto de textos didácticos, que acabou virando romance’’ (Pepetela, online, s.d.). Ademais, Conte (2010) afiram que a escrita dessa obra tinha seu valor instrumental como ferramenta de alfabetização que contribuiria na eficiente leitura das necessidades peremptórias que Angola vivia.
Portanto, isto prova que, Pepetela, logo no início da sua carreira já olhava para a literatura como um mecanismo de engajamento nacional pelo qual podia dar o seu contributo para despertar a nação angolana; de modo que, neste romance, Ngunga, caracterizado como guerrilheiro e nacionalista se levanta contra o regime colonial.
Um outro exemplo que prova que Pepetela tem vindo a fazer uma literatura que intervêm no processo de definição do seu país está presente nos livros Mayombe (1980) e Sua Excelência, de Corpo Presente (2018).
O enredo do romance Mayombe rodopia em torno das várias dimensões daquelas horas em que se está projectando a utopia da libertação nacional. Na floresta situada em Cabinda, os guerrilheiros fazem a luta e discutem sobre a independência e vários assuntos referentes à nação Angolana. Em Sua excelência de corpo presente há uma critica mordaz ao abuso de poder e aos sistemas de governo totalitários disfarçados de democracias.
Nesta perspectiva, evidencia-se a preocupação de Pepetela com a construção da nacionalidade Angolana. Antes da independência, ele escreveu de modo a despertar a identidade cultural Angola e a luta pela libertação. Depois que a independência foi alcançada, continua a abordar nos seus livros assuntos que dizem respeito a lutas humanitárias referentes ao mundo e especialmente angolanas.
Chaves (1999) afirma que a produção literária deste autor organiza as linhas de uma obra onde se pode recolher fios expressivos da própria história de Angola. Talvez mais do que em qualquer outra produção estejam visivelmente assinalados nas suas representações, os impasses e as contradições da história recente do país. A indisfarçada preocupação com os problemas em torno da formação da nacionalidade pode explicar a continuidade de um projecto em cujo interior se manifestam as diversas rupturas que o próprio desenvolvimento da História impõe.
Em suma, nos livros de Pepetela está patente a temática nacionalista e a preocupação pela formação e aprimoramento da identidade Angolana. Portanto, Pepetela na sua produção literária não se divorcia do papel social do escritor e não deixa de explorar elementos referentes à Antropologia, da Etnologia, da Sociologia e da História do seu país.
Agostinho Neto, nascido a 17 de Setembro de 1922, na aldeia Kaxikane, no Bengo, foi o membro mais activo do MPLA e um dos poetas mais importantes de Angola. Foi o primeiro presidente da República de Angola, era médico de profissão e poeta por vocação.
Neto foi um dos que combateram para a libertação de Angola tendo usado a sua poesia como forma de expressão e instrumento de luta contra o colono. Na verdade, na sua poesia nota-se a presença de várias temáticas, mas, entre todas, a negritude ganha a patente mais elevada.
Cosme (1984) afirma que a obra de Neto revela uma poesia trespassada pelas imagens das vivências do homem angolano, mostra a necessidade de sonhar, de lutar pela independência de uma nova Angola e reconquistar a identidade angolana, quase perdida e estilhaçada pela presença do colonizador.
A poesia de Neto foi profundamente marcada pelo tema da conscientização alcançada através da redescoberta dos valores do homem africano, da força e da resistência que este mesmo povo imprimiu desde a primeira investida colonialista. Além desse incontestável valor, a poesia de Neto transcende a cor local e se comunica com as múltiplas vozes dos que, assim como ele, sofreram a dor e a opressão, ou seja, “o homem oprimido da ‘’Sagrada Esperança’’ deixa de ser especificamente o homem angolano, torna-se o Homem Universal. E a causa a qual os poemas são dedicados, torna-se a causa de toda a Humanidade” (Carter, 1989).
De facto, há na escrita de Neto a negação da passividade, do assimilacionismo e da submissão. Estes são alguns dos factores que marcam o anseio deste homem que buscou incessantemente a igualdade e o respeito para todos.
Através dos seus textos percebe-se que indubitavelmente o movimento da Negritude influenciou demasiadamente a sua escrita. Para Laranjeira (1998) a Negritude fundamenta-se na redescoberta da história, da cultura africana e constitui um processo em busca de uma identidade de conduta da defesa do património e do humanismo dos povos negros.
Dentro dessa perspectiva, a escrita de Neto funciona como um movimento de retorno às raízes, na busca por uma identificação positiva com o passado africano, desconhecido pelos seus próprios filhos. Esse retorno às raízes culturais demonstra a necessidade dos africanos de reconstruir seu mundo que foi esmagado pela Europa. E, claramente, a Negritude é o principal elemento temático presente na literatura escrita por Agostinho Neto. Nesse sentido, a obra dele está intrinsecamente ligada à história do seu país e é permeada de imagens da cultura local, além de forte crítica contra as injustiças vivenciadas.
Referências
CHAVES, Rita. Pepetela: romance e utopia na história de Angola. In via atlântica n. 2 jul. 1999.
CONTE, Daniel. O Menino e o Silêncio. Organon, Porto Alegre, nº 47, p. 177-205, jul./dez., 2010.
COSME, Leonel. Agostinho Neto: a poesia e o homem. Luanda: Instituto Nacional do livro e do Disco, 1984.
LARANJEIRA. Pires. A negritude Africana de Língua Portuguesa. Porto: Afrontamento, 1995.
LEITE, Ana Mafalda. A Modalização épica nas literaturas africanas. Lisboa, Veja, 1995.
MENEZES, Filinto Elísio de. Apontamentos sobre a poesia de Angola Maurício Gomes e Viriato da Cruz – precursores de uma poesia em formação. In: LARANJEIRA, Pires. Negritude Africana de Língua Portuguesa. Coimbra: Ângelus Novus, 2000.
PEPETELA, Escritor Angolano, Fala Sobre “A Geração Da Utopia” e suas demais Obras. Portal Raízes. Disponível em: https://www.portalraizes.com/1pepetela-a-geracao-da-utopia/. Acesso em: 25 Julho. 2020.