Não sei, talvez eu tenha nascido para a plateia, ou essa palavra se verte quando diante de mim. No ano passado, levei Noémia a um bar na esquina da Tia Joana, um dos melhores lugares do bairro, diga-se de passagem. Ela pôs-me o sumo na face e de seguida rematou tanta palavra que até hoje me arruína. Lembro-me quando ela disse que a sua maquilhagem era mais cara que a conta de todos que ali se encontravam a beber. Pensei adentro, sorridente, mesmo com as moscas que já cobiçavam o sumo escorrendo na minha confiável camisa.
A Tia Joana foi quem me deu pronto-socorro em palavras e também me deu uma camiseta que mal cobria. Agradeci enquanto a Noémia atravessava a rua. “Para aonde ela vai?”, Perguntava eu, atónito. Virei, de facto, uma cena de teatro com bónus de inúmeras filmagens para posteridade. Ali continuei sentado a imaginar o conceito de amor e das minhas prováveis falhas na sua implementação. A Tia Joana disse ao alto: “Filho, o amor não pensa. O amor não pensa”. A priori achei um pouco acusatório até que parte dos que me filmavam decidiu se juntar à mesa vazia.
“Manda vir um uísque, Tia Joana”, dizia um senhor de uma considerável idade enquanto batia nos meus ombros. Amparou-me em conversas experientes mas também à mistura de conversas de bar. “Então, estavas atrás de broche ou do amor?”, continuava o velho a animar-me em actos provocatórios, “Os lábios da miúda são enormes, parabéns, miúdo”. Dali aprendi a desassociar a intenção e a capacidade e posse. Amei a Noémia que o meu coração sofrido é testemunha, mas ela desalojou-me ao relento onde não se sonha o amor senão a história passada.
Superei. Cá estou eu em outras perspectivas amorísticas. Vânia é a minha nova razão para nunca voltar àquele Bar da Tia Joana e ser a peça teatral. Somos colegas de trabalho e projectamos ser colegas de quarto. O nosso tecto salarial é sorridente, diferente da época da Noémia. Superei, embora algo me inquiete, desde a semana finda que eu penso em confrontar o meu chefe para uma clarificação. A Vânia e o meu chefe têm uma viagem relâmpago para Inhambane, quase fora da nossa jurisdição de trabalho e de parceiros estratégicos. “Justamente no período dos Dia dos Namorados?”. Ela respondeu que a instituição e a República de Moçambique não consideram esse dia um Feriado Nacional, à razão dos factos, irá trabalhar fora do escritório.
Devo voltar ao Bar da Tia Joana? Já passa um tempo que não vou saudar e tirar uns conselhos de gente mais vivida que eu. Não sei se tenho sorte no amor ou faço escolhas de carácter de forma desalinhada aos meus interesses. Queria casar a Vânia em Outubro, ela sabe. Por outra, os meus pesadelos do passado querem ainda me punir. Não vou ceder. Pedi observações e opiniões entre colegas, e dizem que o chefe não faria tal coisa, principalmente porque foi quem redigiu as normas, condutas e posturas dos trabalhadores da instituição. Estou seguro quanto aos conselhos, pese embora eu também tenha participado da revisão desse documento e hoje ande com a Vânia. Somos humanos, não é? Mas o meu chefe está impedido de ser humano para com a minha Vânia.
Por Jorge Zamba