Horas antes, eu era um simples jovem a correr pela cidade vasculhando a sobrevivência. Focado em meus complexos existenciais, fiquei cego para o mundo da paixão porque, às vezes, julgo muito idiota e, honestamente, esse parecer é resultado de muitas pancadas na ponta do coração, mas também li bastante Charles Bukowski, um escritor norte-americano que compara o amor com à dor e à angústia. Quem sou eu para questionar Bukowski, um homem que passou parte da sua vida a beber e a fumar? Respeito muito os frustrados das décadas anteriores a 1960, sabiam escrever a sua dor como testemunho para a próxima geração.
Pela manhã havia dado uma aula baseada na música de Deltino Guerreiro em colaboração com Azagaia, intitulada “Amor com amor se paga”. Foi uma discussão que extravasou os limites do título musical, aceitámos ao convite dos artistas para imaginar e reflectir a nossa essência a partir do conceito solidariedade. À tarde dirijo-me a uma biblioteca nas proximidades da cidade para terminar de ler o livro de Chinua Achebe, O Mundo se Despedaça. Olho à volta com estranheza, não sou mais estudante universitário e o ambiente académico sempre causa calafrios para quem não é frequentador. Vi-a sentada numa cadeira ao longe, era, a priori, apenas uma mulher e considerando o meu humor tímido e indiferente, aproximei-me para pedir que me segurasse o laptop enquanto eu guardava a pasta no cacifo da biblioteca. Acenou com cabeça e defrontámo-nos com um olhar que Bukowski não recomendaria.
Ainda penso que o olhar dela em minha direcção estará a avaliar o meu cabelo despenteado e um brinco na orelha direita. É uma finalista em filosofia e usei o seu curso universitário como porta de entrada para conversar, devia fazer-me académico para talvez ter uma chance de um passeio com segundas intenções. Até hoje não sei se fui feliz na abordagem ou ela soube filosofar acima das minhas expectativas emocionais. Cheguei à casa sem nenhuma imaginação além daquela mulher. Forcei o sono e a sua imagem confundia-se com uma bússola para navegar o mar e acordei desesperado, totalmente idiota que não mais sei definir-me com alguma razoabilidade. Decerto, ela vai rir-se de mim quando a disser que fui ao Google para perguntar: “ Como saber se estou apaixonado por uma mulher.”
Por Jorge Zamba